Em acórdão do dia 8 de outubro de 2009, o Tribunal de Justiça de São Paulo, decidiu pela inconstitucionalidade da Taxa de Resíduos Sólidos Domiciliares, criada pela Lei 13.478/2002, pela ausência de especificidade e inviabilidade de se determinar o volume de lixo que cada residência produz, além da ausência de equivalência com a taxa de limpeza pública e existência de base de cálculo que parte de premissas aleatórias, estando ausente a individualização do custo para cada contribuinte. Entendeu ainda aquela Corte, pela ocorrência de bi-tributação face à alíquota do IPTU anteriormente elevada. Ressalte-se que tal decisão se deu, mesmo após haver sido reconhecida a inconstitucionalidade pelo próprio município de São Paulo e extinta a TRSD pela Lei 14.125/2005.
Essa decisão do TJ/SP debate questões idênticas a algumas constantes do PLC 006/2009, aprovado pela Câmara Municipal de Manaus, por sinal legislação muito similar à lei paulistana que criou a nossa TRSD. Só que na cidade de São Paulo, os vereadores, desconfiados da sanha arrecadadora do município, buscaram garantias para a não elevação de tributos no futuro, como ressalta a decisão mencionada. Nela ficou evidenciado que a Base de Cálculo da famigerada taxa era “palpite oficial de produção do volume de resíduos conforme o bairro em que o morador reside, competindo a este a prova negativa de discordância”. Entenderam os membros da Corte de Justiça paulista, não ser divisível o tributo e que a própria dificuldade levou a essa ficção jurídica no campo do direito, pela qual, conforme o bairro, o morador nele residente seria presumivelmente produtor de um determinado volume de lixo, a partir de um palpite oficial, cabendo ao contribuinte a prova negativa.
Ressalta o acórdão do TJ/SP que “essa fórmula criativa lembra lenda chinesa, pela qual o príncipe herdeiro do trono – que não podia ser contestado – afirmou, certo dia, que vira um dragão. Seu irmão menor o contestou, dizendo que ele mentira. O pai, então, exigiu que o filho menor provasse que não havia dragões na China. E, como ele não conseguiu provar, desde então os dragões passaram a povoar todas as histórias e emblemas do império”.
A decisão colegiada considerou que o ex-prefeito Pitta, autor da lei, teria mostrado a inocência de uma “carmelita descalça” ao adotar tal elevação da carga tributária. A seguir, o acórdão se refere ao mecanismo adotado pela atual administração paulistana, que teria adotado escorchante carga imposta e que, percebendo a indivisibilidade do respectivo serviço e antecipando o entendimento claramente exposto pela Min. Ellen Gracie de que esse serviço é insuscetível de ser custeado por intermédio de uma taxa, incorporou o seu valor ao IPTU, criando uma segunda taxa de lixo, em criatividade comparada a de Spielberg e, como nos efeitos especiais daquele diretor, sem nenhuma conotação com a realidade. Menciona, ainda, o aresto, que os contribuintes deveriam contestar a referida taxa, à luz de decisões do STF que entende que esse serviço é uma prestação de caráter geral, apenas suscetível de ser custeado pela receita de impostos e jamais por taxa e que uma ADIN talvez fosse o melhor caminho para atalhar de vez a esdrúxula exigência tributária, manifestamente inconstitucional.
E o fato do Supremo Tribunal Federal ter editado Súmula Vinculante nº 19, aos 29/10/2009, portanto vinte e um dia depois, pela constitucionalidade da Taxa de Lixo, não contraria de todo os argumentos da decisão do TJ/SP quanto a impropriedade da base de cálculo da mesma - que não pode ser aferida subjetivamente e nem ser relacionada com características do imóvel, ante o princípio da tipicidade fechada e impossibilidade de identidade de fatos geradores dos tributos, além de que sua divisibilidade/especificidade não podem ser aferidas mediante rateio, ficando condicionadas a critérios objetivos, como a pesagem individual do lixo por exemplo.
Texto publicado na coluna do Jornal A Crítica em 06/01/2010
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É chato você ter a sensação de impotência diante de atitudes assim.
ResponderExcluirMinha mãe mora em uma casa relativamente grande. O lixo dela é muito menor que o meu. A alimentação dela é reduzida, além do que é natural. Ela usa parte dos reziduos para adubo do proprio jardim que ela cultiva.
E ai? Só porque a casa dela cabem, digamos, 200 pessoas e a media de lixo de um ser humano é 10 kilos, ela vai pagar uma taxa equivalente a 2.000? Se for um real por kilo, claro.
Enquanto, eu com lixo maior, bem maior, pagarei apenas 10? Vegonhoso isso.
E outro item a ser colocado: cade a coleta seletiva? De 3 em 3 dias eu saio com meu carro para deixar as garrafas e latas com um senhor que vende pra reciclagem. Uma forma de ajuda-lo, tambem.
Os boxes de reciclagem estao caindo aos pedacos e estavam fechados quando ia deixar la, desisti e encontrei essa solucao do senhor.
Para um cidade que será vista/visitada pelo mundo todo, na copa, não ter coleta seletiva é falha grave.
Caro leitor,
ResponderExcluirTanto a questão da correlação entre características do domicílio com a produção de resíduos sólidos - sem levar em consideração a quantidade de residentes e o estilo de vida de cada um (existem pessoas que moram em bairro nobre, em casas espaçosas, mas têm jornada de trabalho integral, se alimentando fora de casa - ex.: pessoal do Distrito Industrial) -, como a coleta seletiva realizada espontaneamente para os catadores que ficaram em situação difícil depois da desativação da lixeira, foram levantadas em representação de inconstitucionalidade ao Procurador-Geral de Justiça do Estado do Amazonas que analisará preventivamente o caso, mesmo que a lei ainda não tenha sido sancionada/publicada, nesse último caso com o fito de expedir recomendação ao Chefe do Executivo.
Obrigada pela contribuição.
Jussara
A estratégia da PMM de meter a mão no bolso do contribuinte é absurda. Cadê a seriedade nas propostas? A questão do lixo em Manaus tem que ser levada a sério. Entender o fluxo completo do lixo dentro de uma cadeia é fundamental pra que em cada etapa as propostas de melhoria aconteçam. Qual é o melhor modelo de responsabidade para a gestão dos resíduos (isso sem falar do outro ponto polêmico que é o de resíduos eletrônicos). Enfim, o tema é complexo e deve ser tratado com seriedade e não de forma amadora como a PMM tenta fazer.
ResponderExcluirConcordo com os argumentos do TJSP e que estes não foram totalmente superados com a edição da SV nº 19. Realmente não seria possível a cobrança de uma taxa de lixo de forma autônoma com o valor a ela correspondente previamente incluso no IPTU. Apenas tenho dificuldade de visualizar uma forma de declarar a inconstitucionalidade da taxa de lixo vez que existe SV afirmando exatamente o contrário.
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