domingo, 26 de junho de 2011

Juiz Social

Lendo alguns artigos da revista ´Juizes para La Democracia´, me chamou a atenção um texto entitulado: “mais vale um bom juiz do que uma boa lei” (tradução livre), abordando o propósito da corrente de um modelo constitucional de Justiça Democrática.

Essa tendência surgiu com o estabelecimento de um Estado de Direito, por meio de um sistema político democrático, onde impera um Poder Judiciário forte e independente, capaz de garantir a efetividade dos direitos individuais e sociais do cidadão, além de fazer valer as garantias democráticas. Montesquieu já dizia que “os juízes são a boca que pronuncia as palavras da lei”. Decidir concretamente o direito, portanto, não é um mero descarregar mecânico de aplicar a norma vigente, não se resume a um automatismo legal.

Mas aí surge uma indagação: por mais rígido que seja um concurso público que selecione magistrados, isso lhe dá legitimidade para fazer e desfazer da vida, do patrimônio e dos interesses de um cidadão? O Juiz tem legitimidade para legislar no caso concreto, na hipótese de inércia do Poder Legislativo? A tendência de muitos autores contemporâneos, como dos juristas afortunadamente ideológicos, é justificar essa legitimidade do exercício cotidiano da atividade judicante proporcionalmente ao apego às leis democráticas, à independência e à imparcialidade do magistrado.

O papel do Juiz Social é exatamente esse! A idéia de um servidor público, que deve atuar na defesa dos interesses do povo, dando ao Poder Judiciário um sentido social e democrático, em vista de que um ideal de Justiça exige um direito justo.

Os Ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) brasileiro vem dando exemplo e assumindo esse papel, essa nova cultura jurídica democrática, sobretudo ante a omissão do Poder Legislativo em regulamentar direitos previstos na Constituição Federal, tornando, no bom sentido do neoconstitucionalismo, nossa ´Constituição viva´, no dizer de Pietro Sanchis, “mais princípios que regras; mais ponderação que subsunção; mais Constituição que leis; mais juiz que legislador”!

* esse texto foi publicado na coluna semanal do Jornal A Crítica de 24/06/2011

Marcha da Maconha

Por decisão unânime, o Supremo Tribunal Federal (STF) liberou, esta semana, manifestações pela legalização das drogas. Em belíssimo voto, acompanhado por todos os demais ministros, o expert em direito constitucional e decano da casa, Celso de Mello, defendeu ser - a ´marcha da maconha´ - um movimento social espontâneo que reivindica, por meio da livre manifestação do pensamento, “a possibilidade da discussão democrática do modelo proibicionista (do consumo de drogas) e dos efeitos que (esse modelo) produziu em termos de incremento de violência”. O Ministro Relator sustentou em seu voto que os direitos constitucionais de reunião e de livre expressão do pensamento garantem ao cidadão a realização dessas marchas.

Mello argumentou que tais eventos possuem caráter nitidamente cultural, considerando que neles são realizadas atividades musicais, teatrais e performáticas, além de criar espaço para o debate do tema por meio de palestras, seminários e exibições de documentários relacionados às políticas públicas ligadas às drogas, sejam elas lícitas ou ilícitas. O Ministro levou em conta, também, que mera proposta de descriminalização de determinado ilícito penal não se confunde com o ato de incitação à prática do delito nem com o de apologia de fato criminoso. Celso de Mello ponderou que o debate sobre a abolição penal de determinadas condutas puníveis “pode ser realizado de forma racional, com respeito entre interlocutores, ainda que a idéia para a maioria, possa ser eventualmente considerada estranha, extravagante, inaceitável ou perigosa”.

Alguns dos demais ministros, em seus votos, ressaltaram que a liberdade de expressão e de manifestação somente pode ser proibida quando for dirigida a incitar ou provocar ações ilegais e iminentes. Carmen Lúcia apontou que tais manifestações podem vir a influenciar na modificação das leis e, parafraseando jurista americano, que não se pode abrir mão da liberdade em prol da segurança, sob pena de não se ter nenhum dos dois posteriormente.

Luiz Fux achou necessário estabelecer parâmetros para essas manifestações, que elas sejam pacíficas, sem uso de armas e incitação à violência, previamente noticiadas às autoridades públicas (data, hora, local, objetivo do evento), sendo imperioso que não haja incentivo ou estímulo ao consumo de entorpecentes, não podendo haver participação de crianças e adolescentes.

A polícia de São Paulo e aqueles que criticaram a recente expressão da opinião do ex-Presidente Fernando Henrique Cardoso, deviam colocar suas barbas de molho!

* esse texto foi publicado na coluna semanal do Jornal A Crítica em 17/06/2011