A consolidação de um “Judiciário do futuro”, respeitado pela comunidade, parte da postura do juiz, apto a solucionar as controvérsias, sejam elas individuais, estatais ou de interesse coletivo, a princípio de modo célere e eficiente. A Emenda Constitucional 45/2004, contudo, trouxe consigo um debate importante sobre a função judicial e seus limites, incitando uma reflexão mais incisiva, do que nas últimas décadas, sobre o sistema de formação adequado à magistratura brasileira.
A averiguação do preparo intelectual do magistrado está diretamente ligada à concepção acerca do papel do juiz na sociedade. Só que conhecimentos técnico-jurídicos, por si só, não são suficientes para se ter qualidade na prestação da atividade jurisdicional, que passa longe dos juízes rotulados de “eficiente burocrata” ou “boca de lei” (termo usado na Espanha), que tem como paradigma uma atuação técnico mecânica e subordinada à legalidade estrita, garantindo neutralidade e apoliticidade “aparentes”, necessárias ao hipócrita “bom” funcionamento da Justiça e ao cômodo “bom relacionamento” e conexões com o poder.
Considerando que a presença de uma forte cultura jurídica legalista – e aí a formação universitária bancária tem sua parcela de culpa, já dizia Paulo Freire – entra em crise com a promulgação de uma Constituição dirigente e com grande carga principiológica, passando-se a se exigir do magistrado uma postura menos conservadora e menos submissa e acrítica à legislação, impondo-se uma conduta mais comprometida com a democracia e com a efetividade dos direitos do cidadão, sobretudo dos menos favorecidos.
Não obstante sua necessária idoneidade e integridade ética e intelectual, como aplicadores e intérpretes do sistema jurídico, além de reconhecer e se despir dos seus próprios valores, preconceitos, contingenciamentos morais, pesquisando a fundo a verdade na reconstrução dos fatos sob seu juízo, é preciso que o magistrado incorpore a dignidade da pessoa humana, os valores sociais, o pluralismo jurídico, o ativismo judicial, os novos sujeitos de direito, acompanhando a evolução social.
Noutras palavras, que o “Magistrado do Futuro” seja menos um modelo funcional de juiz e mais “uma pessoa consciente de que os casos a submetidos à sua decisão implicam em interesses de seres humanos”.
* esse texto foi publicado na coluna semanal do Jornal A Crítica, aos 23/09/2011.
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