Numa das questões mais importantes já decididas pelo Supremo Tribunal Federal (STF), que foi instado a se manifestar em face de mais de três mil decisões de juízes e Tribunais brasileiros autorizando a interrupção gestacional em face da incompatibilidade do feto com a vida extrauterina (o Brasil é o quarto país no mundo em casos de fetos com malformação do tubo neural, com ausência parcial do encéfalo e do crânio), o plenário do STF, por 8 votos a 2, reconheceu o direito da gestante de se submeter a antecipação terapêutica do parto, na hipótese de feto anencéfalo, previamente diagnosticada por profissional habilitado, sem necessidade de autorização judicial ou qualquer outro tipo de permissão do Estado.
Na hipótese, foi dada interpretação conforme aos artigos 124, 126 e 128, incisos I e II do Código Penal e não admitir a tipificação penal da interrupão da gravidez de feto anencéfalo, a fim de compatibilizá-los com a Constituição Federal, em especial, aos preceitos que garantem o Estado laico, a dignidade da pessoa humana, o direito à vida, a proteção da autonomia, da liberdade, da privacidade e da saúde. Assim, reconheceu-se a inconstitucionalidade da interpretação, até então adotada, que considerava crime a interrupção da gestação de feto anencéfalo (com doença congênita letal, incompatível com a vida do feto fora do útero). Caberá agora à gestante decidir se leva adiante a gravidez de feto anencéfalo ou realiza a antecipação terapêutica do parto.
O voto que inaugurou a divergência vencida, todavia, sustentou limites objetivos para a interpretação conforme quando presente a univocidade das palavras, asseverando que quando a lei é clara não há espaço para a interpretação. Noutras palavras, não poderia a hermenêutica afrontar a expressão literal da lei e nem contrariar a vontade manifesta do legislador substituindo-o. Citando Barroso, Canotilho e Bonavides, defendeu que a interpretação conforme só seria legítima quando há espaço para interpretação, não podendo o intérprete dar-lhe sentido contrário quando o texto é claro e inequívoco. E, se referindo às Cortes Constitucionais, exaltou o papel de legislador negativo do STF (retirar do mundo jurídico normas incompatíveis com a CF), sob pena de, a pretexto de dar interpretação conforme, transformar-se em legislador positivo, usurpando, assim, ção de funções de outros poderes. O voto divergente ressaltou ainda o perigo de que essa decisão abrisse portas para que fossem realizados encurtamentos de vida intrauterina em embriões portadores de outras doenças genéticas ou adquiridas, sem a devida aprovação do Parlamento, órgão que teria legitimidade para regular tal questão.
* esse texto foi publicado na coluna semanal do Jornal A Crítica aos 13/04/2012
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