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segunda-feira, 21 de março de 2016
Instabilidade Política
Após o clima tenso da escolha dos membros da Comissão que analisará o pedido de impeachment da Presidente Dilma Roussef, deputados do Psol e da Rede protocolaram na Procuradoria-Geral da República, nessa última quarta-feira (9/12), pedido de afastamento cautelar do presidente da Câmara, Eduardo Cunha, porque o peemedebista estaria atrapalhando os trabalhos da Comissão de Ética que o investiga. Como resposta, Cunha apresentou petição ao Supremo Tribunal Federal, solicitando decisão da Corte que lhe garanta permanência no cargo.
Não bastasse, vem agitando Brasília, também, a possibilidade do senador Delcídio Amaral finalizar acordo de delação premiada. Sobre o senador, há o temor de que suas revelações permitam aos investigadores estabelecer um elo entre a “lava jato” e o mensalão.
E, em meio à comemoração pelo Dia Internacional de Combate à Corrupção, procuradores do Ministério Público Federal (MPF), responsáveis pela operação “lava jato”, avaliaram nessa mesma quarta-feira (9/12) que uma possível delação do senador Delcídio Amaral pode levar as investigações ao “centro político” do esquema de corrupção na Petrobrás. Nesse evento, no qual se deu destaque para a necessidade de aprovação das “10 Medidas Contra a Corrupção”, ainda em processo de recolhimento de assinaturas, o MP avaliou que as propostas vêm recebendo apoio por conta do “custo da impunidade” para o país. O MPF já não esconde que pode desencadear nova operação, de grande impacto, até o fim do mês. Procuradores da equipe de Rodrigo Janot já revelaram a advogados e integrantes do Poder Judiciário que estão colhendo depoimentos cruciais, nesta semana, para a “lava jato” e outras investigações em curso.
Ao mesmo tempo, tem sido bastante elogiada a decisão do ministro Luiz Edson Fachin, do Supremo Tribunal Federal (STF), de suspender a formação da comissão que analisará o pedido de impeachment contra a presidente Dilma Rousseff. Fachin justificou sua decisão afirmando querer evitar o surgimento de "atos que eventualmente poderão ser invalidados pelo Supremo" e "apresentar respostas céleres aos questionamentos suscitados". O país precisa que, ao final do julgamento da presidente Dilma Rousseff, pouco importando o desfecho, não perdure dúvida quanto à legalidade do processo.
Por outro lado, tem sido bastante criticado - o que os analistas políticos chamam de “judicialização extrema” do cenário político brasileiro -, em especial no processo de impeachment contra a presidente, pois não seria tarefa do Supremo definir as regras que a Câmara deve seguir nesse processo, que é definido por uma legislação que está em vigor desde 1950. Todavia, não deve pairar preocupação por conta desse processo de judicialização, pois nos parece alentador, nesta crise política, que o STF haja conquistado forte credibilidade, por ter julgado o mensalão com grande isenção e profissionalismo, também demonstrados até agora no petrolão.
*** Esse texto foi publicado na coluna semanal do Jornal A Crítica, aos 11/12/2015.
Pedido de Impeachment
A autorização para abertura do processo de impeachment contra a Presidente da República Federativa do Brasil, Dilma Roussef, pelo Presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha, repercutiu intensa e negativamente no cenário internacional.
O diário espanhol El País deu destaque ao fato, divulgando em seu site como manchete principal no início da noite desta quarta (2), destacando que o processo contra a presidente se baseia em "manobras fiscais" do governo federal praticadas durante este ano. O periódico espanhol cita, em sua reportagem, que Eduardo Cunha teria alegado que não dava andamento ao processo de impeachment por "motivação política", mas ressaltou que, mais cedo, a bancada do PT na Câmara havia anunciado que iria votar pela continuidade do processo de cassação do presidente da Câmara no Conselho de Ética, portanto, deixando claro haver assimilado a verdadeira motivação.
No portal de um dos principais jornais britânicos, o The Guardian, a notícia foi divulgada também na home, ao lado da principal manchete sobre tiroteio na Califórnia. Em sua matéria, o jornal destaca que "o Brasil afundou em sua pior crise política deste século após o presidente da Câmara ter aceitado o pedido para abertura do processo de impeachment da presidente Dilma Rousseff".
O site do The Wall Street Journal, importante jornal americano, colocou uma foto da presidente Dilma em destaque em sua seção de notícias internacionais, abaixo de notícias sobre atualidades, negócios, mercados e vida cotidiana. Na matéria, liberada apenas para assinantes, o jornal destaca que Eduardo Cunha afirmou "não estar feliz" tendo que tomar essa decisão.
O jornal argentino El Clarin afirmou que o caso “provoca uma grande incerteza jurídica, acentuando uma crise que se prolonga desde o início do ano”.
Outros veículos de comunicação de diversos outros países divulgaram a baixa popularidade da Presidente, apontando como principal motivo ela haver enganado o povo sobre a real situação econômica do país para se reeleger, além do rombo fiscal e orçamentário descoberto na análise das contas de Dilma Roussef pelo Tribunal de Contas da União.
A repercussão internacional, todavia, não ocorreu apenas na mídia. Ante a instabilidade política atual no país, já se fala em rebaixamento do Brasil pelas agências de classificação internacional e perda de investimentos, o que pode agravar, ainda mais, a situação econômica do país.
*** Esse texto foi publicado na coluna semanal do Jornal A Crítica, aos 04/12/2015.
Congresso Internacional
No próximo domingo (dia 29/11), dia de mobilização mundial em prol do novo tratado internacional que se pretende costurar na Conferencia Mundial sobre Mudanças Climáticas que ocorrerá em Paris, estarão reunidos em Manaus, na abertura do V Congresso da Rede para o Novo Constitucionalista Latino-Americano: O Novo Constitucionalismo Latino-Americano, com o tema local “Democracia na América Latina: Direitos da Natureza (Pachamama) e Humanidades”, que ocorrerá no Salão Solimões, anexo ao Palácio Rio Negro, pesquisadores, estudiosos e doutrinadores da formação e perspectivas do Novo Constitucionalismo Latino-Americano, dos processos constituintes na América Latina, dos processos de integração regional, do Constitucionalismo Pluralista, dos Direitos da Natureza, da Natureza/BemViver e Desenvolvimento com Equidade, do regime descolonial dos bens da natureza, da Democracia na América Latina e da Jurisdição Constitucional e da Democratização do Judiciário e do Ministério Público.
Esse Congresso, que já vai se realizar na sua quinta versão, é um evento idealizado pela Rede para o Constitucionalismo Democrático latino- americano. O evento, a ser realizado em Manaus, está sendo organizado pela Universidade do Estado de Amazonas (UEA) e pelo Programa em Pós-Graduação em Direito da Universidade Federal do Ceará (UFC), em associação e com o apoio das seguintes universidades: Universidade Federal de Goiás, Universidade Federal de Santa Catarina, Universidade Federal do Rio de Janeiro, Universidade Federal de Pernambuco, a Universidade Católica de Pernambuco, Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais. As entidades apoiadoras são MPAM, TCE/AM, ALE/AM, AMAZONASTUR e Governo do Estado do Amazonas.
As reflexões sobre o Novo Constitucionalismo latino-americano têm a finalidade de promover a análise dos novos textos constitucionais latino americanos, esse novo contexto constitucional que parte do Sul, enfatizando as experiências conectadas com a realidade social que tenham uma eficaz incidência na necessária transformação social, democrática, justa e livre.
Além da interculturalidade e da plurinacionalidade, entre os principais aportes teóricos emanados do Novo Constitucionalismo Democrático Latino-Americano encontram-se, sob o ponto de vista substancial, aqueles atinentes ao reconhecimento constitucional dos direitos de Pachamama (direitos da natureza), ou seja, à Terra como sujeito de dignidade e de direitos, à mutação no vetor informativo epistemológico do meio ambiente nas Constituições (passagem do antropocentrismo para o biocentrismo ou ecocentrismo), bem como à consagração dos direitos humanos de segmentos historicamente invisíveis ou marginalizados, como aqueles dos povos indígenas, das mulheres e dos negros. Pode-se, em linhas gerais, reconduzir essa contribuição material do constitucionalismo latino americano à proposta do Bem Viver ou Buen Vivir, adotada pelas Constituições do Equador (2008) e da Bolívia (2009) e por seus respectivos programas de Governo.
Para Gargarella (2010:12), o Novo Constitucionalismo Latino Americano desencadeia muitas promessas e dúvidas. O jurista argentino aponta como desafio principal, neste novo ambiente constitucionalista, a indagação sobre o que as Constituições devem responder nos contextos políticos, sociais, econômicos e jurídicos marcados, historicamente, pela desigualdade, exclusão e, no plano político, pelo hiper- presidencialismo, entre outras questões de fundamental relevância, como a filosofia pública das constituições, o transplante constitucional e as condições materiais do constitucionalismo. Assim, quando as novas constituições latino americanas – destacam-se as da Bolívia, Equador – atribuem subjetividade à Mãe Terra e às complexas relações dos seres e sociedades que configuram os direitos da Pachamama e do Buen Vivir configurados nas cosmovisões indígenas do Sumak Kawsae, Suma Qamaña e Ñandereko, abrem-se, pelo menos no plano jurídico-formal, para outros planos de vida, outros modos de configuração do Estado, do Direito, dos Sujeitos, das Relações e das Titularidades, plurais, por excelência.
Para Alberto Acosta1 no centro das atenções do Buen Vivir – com projeção global – está implícito um grande passo revolucionário que nos impele a mudar de visões antropocêntricas para visões sóciobiocêntricas, assumindo os consequentes desafios políticos, econômicos e sociais. Nesse sentido, a construção do Buen Vivir deve ser útil para encontrar respostas a desafios globais que a humanidade enfrenta.
Sob essa perspectiva, a Teoria do constitucionalismo democrático latino americano, em especial, a proposta do Bem Viver, correlaciona-se estreitamente aos atuais desafios globais de sustentabilidade e de efetividade e garantia dos direitos fundamentais e dos direitos humanos, com possibilidade de provocar impacto universal e transcendente ao campo eminentemente jurídico e de refletir imediatamente sobre a realidade latino americana, com influências no âmbito da construção jurídica de espaços transnacionais em formação no continente.
*** Esse texto foi publicado na coluna semanal do Jornal A Crítica, aos 27/11/2015.
Teto Constitucional
O Supremo Tribunal Federal (STF) firmou o entendimento, nessa última quarta-feira (18/11) de que, para efeito de observância do teto constitucional previsto no artigo 37, inciso XI, da Constituição Federal, computam-se também valores percebidos antes da vigência da Emenda Constitucional 41/2003 a título de vantagens pessoais pelo servidor público. Com repercussão geral reconhecida, essa decisão foi tomada no julgamento do Recurso Extraordinário (RE) 606358, o que leva a aplicação da decisão a todos os processos judiciais que discutem a mesma questão e que estavam suspensos (ou sobrestados). Nessa decisão, os ministros dispensaram os servidores de restituírem os valores eventualmente recebidos em excesso e de boa-fé até a data do julgameto (18/11/2015).
Em recurso proposto pelo Estado de São Paulo, questionava-se acórdão da 9ª Câmara de Direito Público do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) que, apreciando apelação de um agente fiscal de rendas aposentado, afastou a incidência do teto remuneratório constitucional (correspondente aos proventos do governador do estado), para assegurar-lhe o pagamento de vantagens pessoais como adicional por tempo de serviço (quinquênios), prêmio de produtividade e gratificação de 30%. Com essa decisão o STF reformou entendimento do TJ-SP, de que a suspensão do pagamento das vantagens, mesmo após o advento da EC 41/2003, ofenderia os princípios do direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a garantia da irredutibilidade de vencimentos.
Em seu voto, seguido pela maioria dos ministros da Corte, a ministra Rosa Weber fez um histórico da matéria e mostrou a evolução ocorrida na jurisprudência do STF quanto ao tema, que culminou no julgamento do RE 609381, em outubro do ano passado, quando a Corte afirmou que a regra do teto remuneratório dos servidores públicos tem eficácia imediata, admitindo a redução de vencimentos daqueles que recebem acima do limite constitucional. Segundo a relatora, a Constituição Federal assegura a irredutibilidade dos subsídios e dos vencimentos dos exercentes de cargos e empregos públicos que se inserem nos limites impostos pelo artigo 37, XI, da Lei Fundamental mas, ultrapassado o teto, cessa a garantia oferecida pelo artigo 37, XV, que textualmente tem sua aplicabilidade vinculada aos montantes correspondentes”. A ministra disse ainda que a adoção do teto remuneratório foi um “mecanismo moralizador da folha de pagamentos na Administração Pública”.
*** Esse texto foi publicado na coluna semanal do Jornal A Crítica, aos 20/11/2015.
Sociedade de Advogados
A Comissão de Constituição e Justiça da Câmara dos Deputados aprovou, na última terça-feira (10/11), um projeto de lei permitindo a constituição de sociedades de apenas um advogado. O texto segue para o Senado. Para o presidente da OAB nacional, Marcus Vinicius Furtado Coêlho:“Trata-se de uma importante conquista que permitirá ao colega que atua sozinho aderir ao Simples Nacional, usufruindo de alíquotas tributárias mais favoráveis, além de pagamento unificado de oito impostos federais, estaduais e municipais (ISS, PIS, COFINS, IRPJ, CSLL, IPI, ICMS e ISS) e da contribuição previdenciária, facilitando e descomplicando a gestão de pequenos escritórios”.
Prevaleceu no texto a redação dada pelo substitutivo do deputado Aelton Freitas (PR-MG), que alterou de “sociedade individual do advogado” para “sociedade unipessoal de advocacia” o tipo de contrato social possível para organizações de somente um profissional. O texto modifica o Estatuto do Advogado (Lei nº 8.906) para incluir a previsão de escritórios com um advogado. Dessa forma, as futuras sociedades unipessoais gozarão dos mesmos benefícios concedidos às bancas atuais.
Nas últimas semanas, a seccional do DF da OAB vem aceitando o registro de Empresas Individuais de Responsabilidade Limitada (Eireli), compostas por um advogado, da forma como autoriza o Código Civil (10.406/2012).
A Lei no 12.441 de 11 de julho de 2011 já havia alterado a Lei no 10.406/2002 (Código Civil) para permitir a constituição de empresa individual de responsabilidade limitada (EIRELI). Entretanto, os advogados não puderam beneficiar-se dessa alteração, porquanto regidos pela Lei no 8.906/94 (Estatuto da Advocacia) que somente contempla a hipótese de sociedade de advogados, não havendo previsão expressa que permita a constituição e o registro de uma sociedade individual do advogado. Tal situação gerou uma discriminação indevida, pois todos podem constituir sociedades unipessoais, menos os advogados que são regidos por lei especial, razão pela qual se faz justo e necessário a inclusão formal da sociedade individual do advogado na Lei no 8.906/94 (Estatuto da Advocacia).
A redação sugerida no anteprojeto não modifica o regime de responsabilidade ilimitada do advogado no exercício da sua profissão estabelecido no art. 17 da Lei no 8.906/94 que prevê que “além da sociedade, o sócio e o titular da sociedade individual do advogado respondem subsidiária e ilimitadamente pelos danos causados aos clientes por ação ou omissão no exercício da advocacia, sem prejuízo da responsabilidade disciplinar em que possa incorrer.”
Em conclusão, ao eliminar a discriminação indevida para permitir que a sociedade individual do advogado possa ser utilizada pelos advogados, a alteração legislativa dará plena eficácia ao comando constitucional de que o advogado é indispensável à administração da Justiça (CF art. 133). Assim sendo, a sociedade individual do advogado poderá ser adotada por milhares de advogados que exercem individualmente sua profissão e, assim, fomentar a organização e o desenvolvimento da classe profissional, além de permitir a diminuição da informalidade com todos os benefícios decorrentes do empreendedorismo.
*** Esse texto foi publicado na coluna semanal do Jornal A Crítica, aos 13/11/2015.
Direito de Resposta
O Senado Federal aprovou, nessa última quarta-feira (04/11), o Projeto de Lei nº 141/11 que estabelece procedimentos para o exercício do direito de resposta por pessoa ou empresa que se sinta ofendido em matéria divulgada pela imprensa.
De acordo com o projeto, de autoria do senador Roberto Requião, o ofendido terá 60 (sessenta) dias para pedir ao meio de comunicação o direito de resposta ou a retificação da informação. O prazo conta a partir de cada divulgação. Se tiverem ocorrido divulgações sucessivas e contínuas, conta a partir da primeira vez que apareceu a matéria.
O texto considera ofensivo o conteúdo que atente, mesmo por erro de informação, contra a honra, a intimidade, a reputação, o conceito, o nome, a marca ou a imagem de pessoa física ou jurídica. A resposta deverá ser do mesmo tamanho ou duração, e com as mesmas características da matéria considerada ofensiva, se publicada em mídia escrita ou na internet.
No projeto original aprovado pelo Senado, a retratação espontânea do veículo cessaria o direito de resposta, mas não impediria a possibilidade de ação de reparação por dano moral. Na Câmara, os deputados alteraram esse trecho da proposta, determinando que a retratação ou a retificação espontânea não cessará o direito de resposta nem prejudicará a ação de reparação por dano moral.
O texto aprovado adotou parecer do relator, senador Antônio Carlos Valadares, que acolheu emenda da Câmara incluindo artigo para garantir ao ofendido, se assim o desejar, o direito à retratação pelos mesmos meios em que se praticou a ofensa. O relator também rejeitou emenda da Câmara que suprimia artigo do texto original e restabeleceu o direito ao ofendido de dar a resposta ou retificação no rádio ou na TV por meio de gravação de áudio ou vídeo autorizado pelo juiz.
O texto já havia sido aprovado pelos senadores em 2013, mas foi alterado pelos deputados em votação na Câmara em outubro deste ano. Por isso, as mudanças tiveram de ser avaliadas pelos senadores. Agora, o texto segue para sanção da presidente Dilma Rousseff.
Ao votar a proposta em outubro, os deputados haviam retirado do texto aprovado inicialmente pelo Senado o trecho que previa que, em caso de TV ou rádio, o ofendido poderia requerer dar a resposta ou fazer a retificação pessoalmente. Essa alteração, entretanto, foi derrubada pelos Senadores. Assim, o texto que vai à sanção da presidente prevê essa possibilidade.
Outra mudança feita pela Câmara dos Deputados foi a inclusão, no Código Penal, de um parágrafo que estabelece que, em casos de calúnia e difamação nos quais foi utilizado meio de comunicação, o ofendido poderá, se assim quiser, usar os mesmos meios para se retratar. Esse trecho foi mantido pelos senadores.
Essa regulamentação é considerada importante por alguns juristas levando em conta que, desde o julgamento da inconstitucionalidade da Lei de Imprensa pelo Supremo Tribunal Federal (STF), o direito de resposta havia ficado sem legislação que o amparasse.
*** Esse texto foi publicado na coluna semanal do Jornal A Crítica, aos 06/11/2015.
Contrato Sem Licitação
A 13ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJRJ) determinou que dois escritórios de advocacia, contratados pela prefeitura de Niterói, devolvam os honorários que receberam, entendendo que as bancas assumiram o risco de prestar o serviço mesmo sabendo “do vício insanável de origem” decorrente da dispensa do procedimento. Essa decisão vem de encontro a entendimento assentado no Superior Tribunal de Justiça (STJ), no sentido de que mesmo que um contrato firmado com a administração pública seja nulo por ausência de licitação, o ente público não pode deixar de pagar pelos serviços prestados. É que o STJ havia firmado jurisprudência, no julgamento do Recurso Especial 1.394.161/SC, de que os valores pelos serviços só não devem ser pagos em caso de má-fé.
Todavia, Os Desembargadores do TJRJ deram razão, de forma unânime, ao Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro (MPRJ), em recurso contra a sentença que havia julgado improcedente o pedido do órgão, mesmo com os contratos já terminados e o serviço tendo sido prestado. Importante ressaltar que, sobre o mesmo tema, tramita no Supremo Tribunal Federal (STF), desde 2011, Recurso Extraordinário que teve repercussão geral reconhecida, no qual será definida a possibilidade, ou não, de município que não dispõe de Procuradoria Jurídica contratar escritório de advocacia sem licitação.
Para entender melhor o caso: ambos os escritórios foram contratados em 2003, para defender o município em ações movidas por outras prefeituras, que buscavam impedir a destinação de parte dos royalties do petróleo para a cidade de Niterói. Um escritório recebeu R$ 6,9 milhões de honorários pelo serviço prestado. O outro, R$ 2,6 milhões. Os valores correspondem a cerca de 10% do valor das causas. As bancas justificaram a dispensa da licitação em razão da urgência do caso, pois a Justiça já havia deferido liminar que retirava Niterói da lista de municípios com direito a receber os recursos dos royalties, assim como da notória especialização na área.
O Desembargador Agostinho Teixeira, relator do caso, explicou que a Lei 8.666/93, que trata da licitação, prevê situações nas quais o procedimento pode ser dispensado. Pelo artigo 25 da norma, a inexigibilidade ocorre quando não é possível a competição para a contratação de serviços técnicos a serem prestados por profissionais ou empresas de notória especialização. Segundo o desembargador, entre esses serviços técnicos, o artigo 13 da Lei de Licitações prevê “o patrocínio ou defesa de causas judiciais ou administrativas”. Mas, na avaliação dele, a hipótese não se aplica ao caso. “Penso que, no caso concreto, os serviços de advocacia não eram singulares, tanto que a administração utilizou dois escritórios distintos. Isso já demonstra a viabilidade da licitação, pelo menos entre os dois contratados”, explicou. “E ainda que se admita a notória especialização dos réus, não seria difícil apontar, apenas no estado do Rio de Janeiro, diversas outras firmas de advocacia que ostentam similar expertise, igualmente dotadas do requisito legal da notória especialização”, justificou. Na avaliação do desembargador, os escritórios assumiram o risco ao aceitarem a contratação de forma direta. “Após detida análise das circunstâncias fáticas que envolveram as contratações, verifico que os recorridos concorreram diretamente para a nulidade, porque atuaram em causas despidas de singularidade [...]. Como profissionais do Direito, os envolvidos sabiam ou deveriam saber que a licitação era imprescindível. Consequentemente, a nulidade é imputável aos recorridos”, afirmou.
De acordo com a decisão, os escritórios terão que devolver ao município de Niterói os valores que receberam em razão dos contratos anulados, corrigidos desde o pagamento acrescidos de juros de 1% ao mês. Cabe recurso.
*** Esse texto foi publicado na coluna semanal do Jornal A Crítica, aos 30/10/2015.
Pedaladas Fiscais
O Tribunal de Contas da União (TCU) rejeitou, pelo voto unânime de seus membros, as contas do exercício financeiro de 2014 da gestão da presidente Dilma Rousseff (PT). O parecer aprovado nesta última quarta-feira (7/7), que atesta que o governo federal emitiu créditos suplementares sem aprovação do Legislativo e utilizou R$ 40 bilhões para maquiar o balanço contábil por meio das chamadas pedaladas fiscais (atrasos propositais no repasse de recursos aos bancos públicos que honraram o pagamento de programas sociais), será submetido ao Congresso Nacional, onde ocorrerá o julgamento das contas. Para derrubar o parecer prévio do TCU a Presidente precisará do voto qualificado de 2/3 dos membros das duas Casas.
O voto do relator do caso, ministro Augusto Nardes, atestou que o governo fez manobras ilegais para que bancos públicos financiassem programas sociais da gestão petista. A decisão do TCU pode ensejar eventual processo de impeachment da presidente Dilma Rousseff por descumprimento da lei de responsabilidade fiscal e consequente crime de responsabilidade. Atacado pelos governistas por ter se pronunciado durante o processo, o ministro Augusto Nardes, em seu parecer, fez questão de salientar que o seu posicionamento é técnico. “O que se observou foi uma política extensiva de gastos sem responsabilidade fiscal e transparência. Essa posição é de 14 auditores concursados, portanto, absolutamente técnica”.
Durante o julgamento no plenário do TCU, auditores fiscais que participaram de todo o processo vibravam a cada frase do relator. Até a tarde de quarta, o governo ainda alimentava esperança de que o Supremo Tribunal Federal (STF) cancelasse o julgamento. No entanto, o ministro Luiz Fux sepultou qualquer chance governista ao não acatar o mandado de segurança da Advocacia-Geral da União (AGU).
Mesmo diante da gigantesca derrota, o Planalto espera que o Presidente do Congresso Nacional, o peemedebista Renan Calheiros, utilize o regimento da Casa para protelar a votação do decreto legislativo com base no parecer do tribunal aprovado ontem. Regimentalmente, o peemedebista não tem prazo para encaminhar o posicionamento da Corte à Comissão Mista de Orçamento (CMO), presidida pela senadora Rose de Freitas (PMDB), aliada de Renan.
Após análise do colegiado, a matéria ainda volta para a mesa do peemedebista. Só após esse percurso, ele pode pautar para ir à votação no plenário do Senado. Depois disso, se aprovado, segue para a Câmara dos Deputados. Passando pelas duas Casas, o decreto legislativo rejeitando as contas é promulgado e a presidente fica inelegível. A partir daí, o caminho para o processo de impedimento da petista fica aberto.
O ministro Nardes fez sucesso nas redes sociais pela forma como encerrou a sua apresentação após a reprovação das contas de Dilma no TCU – Tribunal de Contas da União. "As nações fracassam quando as instituições deixam de cumprir com sua missão. Cumprimos nossa missão de forma técnica, transparente, na busca de um futuro melhor para a nação brasileira", disse ele. A resposta foi encarada como um “recado” para Dilma, que o perseguiu e tentou intimidá-lo por sua postura e por suas declarações anteriores.
*** Esse texto foi publicado na coluna semanal do Jornal A Crítica, aos 09/10/2015.
Planejamento Familiar
Em Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) que tramita perante o Supremo Tribunal Federal (STF), o Procurador-Geral da República (PGR), Rodrigo Janot, emitiu parecer classificando como uma grave violência contra a mulher o dispositivo da Lei nº 9.263, de 1996, que trata do planejamento familiar, em face da exigencia expressa do consentimento prévio do cônjuge para a realização de cirurgia de esterilização.
No parecer Janot argumenta que a mulher será especialmente atingida por este ponto da lei. Os fundamentos seriam históricos e fundados nas discriminações contra a mulher existentes nos mais diversos setores sociais. Ponderou o PGR que, ao criminalizar esterilização voluntária realizada sem consentimento do cônjuge ou companheiro, está se impondo à mulher situação de restrição extrema. Com isso, ela ficaria sob a dupla ameaça da criminalização do aborto e da esterilização sem consentimento do cônjuge, na constância da sociedade conjugal. Para o Chefe do MP Federal, a situação consubstancia grave violência sociojurídica e até psicológica, inaceitável anacronismo jurídico, porquanto o Estado, ao criminalizar ambas as condutas – o aborto e a esterilização voluntária realizada sem consentimento de terceiro –, impõe reprodução não planejada aos casais e colide frontalmente com o direito constitucional a planejamento familiar.
A lei do planejamento familiar, ainda conforme o entendimento do MP, não poderia impor limites ao direito individual da mulher e também do homem de dispor do próprio corpo: “Planejamento familiar é, sem dúvida, decisão autônoma das famílias, mas, em passo antecedente, se funda nos princípios da dignidade humana e da paternidade responsável. O planejamento familiar extrai-se da dignidade do ser humano e de direitos fundamentais essenciais, como o direito à intimidade e à saúde, em suas várias dimensões (física, mental, sexual etc.)”. Noutras palavras, o exercício da liberdade e da disponibilidade física do corpo do indivíduo não deve depender de consentimento de terceiros, sob pena de ser, sem justificativa legítima, severamente debilitado.
O artigo 10 da lei estabelece que “somente é permitida a esterilização voluntária em homens e mulheres com capacidade civil plena e maiores de vinte e cinco anos de idade ou, pelo menos, com dois filhos vivos, desde que observado o prazo mínimo de sessenta dias entre a manifestação da vontade e o ato cirúrgico, período no qual será propiciado à pessoa interessada acesso a serviço de regulação da fecundidade, incluindo aconselhamento por equipe multidisciplinar, visando desencorajar a esterilização precoce”. E o parágrafo 5o determina que “na vigência de sociedade conjugar, a esterilização depende do consentimento expresso de ambos os cônjuges”.
A ação que levanta a inconstitucionalidade da lei – ADI 5.097 – é movida pela Associação Nacional de Defensores Públicos. Essa ADI foi ajuiada em março do ano passado e distribuída para relatoria do ministro Celso de Mello. Entretanto, apenas em fevereiro deste ano o ministro determinou a adoção do rito abreviado para o julgamento da medida cautelar.
O Ministério Público, apesar de concordar com a tese defendida pelos advogados, argumentou que não há pertinência temática entre as finalidades da Anadep e a contestação da lei de planejamento familiar. Por isso, preliminarmente, Janot defendeu no parecer que a ação direta de inconstitucionalidade não seja conhecida. Todavia, parecer que esse argumento não será considerado pelo STF e o mérito da ADI será julgado.
*** Esse texto foi publicado na coluna semanal do Jornal A Crítica, aos 02/10/2015.
Maioridade Penal
No meio do debate sobre a redução da maioridade penal de 18 para 16 anos, o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) completou 25 anos (13/07/2015). A mudança, de acordo com defensores dos Direitos Humanos abre precedente para uma reinterpretação do ECA. Para o coordenador do Movimento Nacional de Direitos Humanos em São Paulo e assessor jurídico da organização não governamental Aldeias Infantis SOS, o advogado Ariel de Castro Alves, reduzir a maioridade penal seria como "revogar" o ECA em relação à proteção de adolescentes entre 16 e 17 anos: "Vejo que seria um duro golpe contra o ECA. Pode provocar uma fragilização, porque a interpretação que pode ocorrer é que aqueles entre 16 e 17 anos, por terem a maioridade penal, não seriam mais sujeitos à proteção especial. Por exemplo, como considerar vulnerável diante da exploração sexual uma adolescente de 16 ou 17 anos que já pode responder até criminalmente por seus atos?”. A partir daí abre-se uma discussão, ainda, acerca da proteção do adolescente em relação ao consumo de bebidas alcoólicas. “Como impedi-lo de consumir bebidas alcoólicas, como punir quem fornece bebidas para aquele com idade entre 16 e 17 anos se ele é considerado imputável?”
Para outros especialistas, dentre eles doutrinadores que participaram da elaboração do ECA, as discussões sobre a redução da maioridade penal, no entanto, poderiam ser evitadas se o ECA, sancionado no dia 13 de julho de 1990, fosse cumprido em sua totalidade, pois existem uma série de princípios que não se aplicam, por exemplo, os programas socioeducativos. Há 25 anos que está faltando competência técnica e gente especializada nesse assunto. Então, não seria para mudar a lei, mas sim a realidade.
Para a relatora do ECA na Câmara dos Deputados, a ex-deputada Rita Camata (PSDB-ES), , reduzir a maioridade penal é “acender um barril de pólvora”. De acordo com ela, o estatuto prevê punição para o adolescente infrator a partir dos 12 anos de idade. “Há uma grande confusão por parte dos que defendem a redução. Eles acham que o estatuto que impede [a punição dos adolescentes]. Mas o estatuto prevê que o adolescente seja responsabilizado a partir dos 12 anos.”
Segundo o presidente nacional da Comissão de Direitos Humanos do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Everaldo Patriota, nas últimas duas décadas e meia, o Brasil criou uma “equação terrível” na política de prevenção e de ressocialização dos jovens. “Nós não cumprimos o ECA e agora estamos tratando dos efeitos e esquecendo a causa”, destacou. “A sociedade toda está tomada por uma paranoia de insegurança coletiva, mas o que foi que fizemos com nossas crianças e adolescentes? Não cuidamos delas e agora vamos criminalizá-las?”, indagou.
Para Edson Sêda, um dos redatores do ECA, a sensação de impunidade para o adolescente infrator decorre da falha de governos na execução das medidas de privação de liberdade e de liberdade assistida. “A lei manda controlar, mas não controlam. Manda fiscalizar a liberdade assistida, mas não se fiscalizam. Sêda lembrou que o estatuto prevê acompanhamento e punição ao jovem infrator não apenas até os 18 anos, mas aos 21 anos. “A lei não manda soltar o menino aos 18 anos nem apenas depois de três anos de internação. Ela fala que a liberdade compulsória ocorre aos 21 anos e que a liberdade assistida também deve ocorrer até os 21.”
Na avaliação do Instituto Alana, entidade que atua em prol da infância, o combate à violência não pode se restringir ao debate sobre a redução da maioridade penal. “Menos de 1% dos adolescentes são responsáveis por crimes contra vida no Brasil”, argumentou Pedro Hartung, advogado da instituição. “A violência é um problema estrutural e social. Isso tem a ver com acesso às políticas públicas mais básicas”.
*** Esse texto foi publicado na coluna semanal do Jornal A Crítica, aos 25/09/2015.
Financiamento de Campanha
A Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) sobre doações de empresas para financiar campanhas políticas, que começou a ser julgada em 2013, ficou parada por quase um ano meio devido a um pedido de vista do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Gilmar Mendes, que devolveu o processo à corte no último dia 10 de setembro. Quando o ministro pediu vista do processo, já haviam sido proferidos sete votos: seis a favor da inconstitucionalidade do financiamento empresarial e apenas um contra o pedido. O relator da ação, ministro Luiz Fux, votou pelo fim do financiamento empresarial de campanhas eleitorais. Seu entendimento foi seguido pelo então presidente da corte, Joaquim Barbosa, e pelos ministros Marco Aurélio, Ricardo Lewandowski, Luis Roberto Barroso e Dias Toffoli, formando uma maioria de seis votos. O único a votar pela validade das doações de empresas foi o ministro Teori Zavascki. Para concluir o julgamento, faltavam apenas quatro votos: Gilmar Mendes, Rosa Weber, Cármen Lúcia e Celso de Mello.
Na última quarta-feira (16/09), em um voto com duras críticas ao PT, Gilmar Mendes, acompanhou a divergência e se posicionou favorável às doações de empresas a campanhas e partidos políticos. O ministro também acusou a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), autora da ação que contesta o financiamento empresarial, de participar de uma "conspiração" para beneficiar o PT, partido que defende o financiamento público de campanha. Mendes falou por mais de quatro horas para defender a doação de empresas a partidos políticos. Em seu voto, o ministro argumentou que a proibição das doações empresariais tornaria necessário o financiamento público, feito com recursos do governo, de gastos elevados das campanhas. Além disso, segundo Mendes, o modelo de voto em lista fechada seria o que melhor poderia ser financiado com recursos públicos. Nesse modelo, o eleitor vota nos partidos, que por sua vez apresentam a lista dos candidatos que seriam eleitos. Disse Mendes: “Nenhuma dúvida de que ao chancelar a proibição das doações privadas estaríamos chancelando um projeto de poder. Em outras palavras, restringir acesso ao financiamento privado é uma tentativa de suprimir a concorrência eleitoral e eternizar o governo da situação”. Afirmou, ainda, o ministro vistante ser “curioso que essa ideia [de proibir doações] coincida com os propósitos do Partido dos Trabalhadores, do próprio governo. (...) Mas veja, essa tem sido a preocupação do partido no poder há quatro mandatos". Mendes acrescentou que "O mote dessa ação era conseguir no Supremo o financiamento público, conseguindo depois que o Congresso aprovasse a [eleição] em lista", disse. "Se isto não for uma 'conspirata', eu não sei qual o nome que se pode dar a isso", afirmou o ministro. O ministro Gilmar apontou ainda que a proibição das doações de empresas iria levar os partidos de oposição “à falência” e beneficiar os partidos da base governista, que supostamente têm se financiado a partir do esquema de propina investigado pela operação Lava Jato.
Ao final da sessão, o secretário-geral da OAB, Cláudio Souza, representante da Ordem no julgamento, pediu a palavra e contestou as alegações do ministro em seu voto. Segundo Souza, a ação não tem qualquer relação com posições de partidos políticos, e a decisão de acionar o STF foi tomada após deliberação do Conselho Federal da Ordem, que possui 81 integrantes, três de cada Estado brasileiro. "O partido da OAB é a Constituição, e entendemos que ela veta doações empresariais. Seis ministros pensam da mesma forma", afirmou Souza em entrevivsta após o julgamento.
*** Esse texto foi publicado na coluna semanal do Jornal A Crítica, aos 18/09/2015.
Terras Indígenas
Em função dos balizamentos estabelecidos pelo Supremo Tribunal Federal (STF) em 2009, por ocasião do julgamento do caso Raposa Serra do Sol, o conceito de “terras tradicionalmente ocupadas pelos índios” só abrange as terras ocupadas por índios quando da promulgação da Constituição de 1988. Portanto, a partir de então, consagrou-se o entendimento de que áreas de aldeamentos extintos, ainda que ocupadas em passado remoto, não são protegidos pelo dispositivo constitucional. Essa questão voltou à tona recentemente.
Para melhor compreensão do tema, em novembro de 2012, 108 produtores rurais residentes na região afetada ajuizaram ação ordinária contra a Fundação Nacional do Índio (Funai) e a União, pleiteando a declaração de nulidade do ato normativo editado pelo Ministério da Justiça. De acordo com os autores, em torno de 300 famílias detentoras do domínio e da posse de imóveis rurais estavam na iminência de ser removidas para dar lugar ao grupo indígena Chiripá e Mbya. Conforme alegaram, suas propriedades eram exploradas em regime de agricultura familiar, constituindo-se na única fonte de sustento. A Funai contestou, destacando que o procedimento de identificação e delimitação da Terra Indígena de Mato Preto seguiu todas as etapas estipuladas no Decreto 1.775/96, comprovando a tradicionalidade da área. Discorreu, ainda, sobre as características da ocupação e posse da terra pelos indígenas baseada na Teoria do Indigenato, argumentando se tratar de um direito originário que não decorreria de nenhum outro e de nenhuma situação fática que não a própria história dos índios no Brasil. Atuando como interessado, o Ministério Público Federal (MPF) defendeu que as definições de ocupação tradicional ou do que seria necessário ou não para a sobrevivência física e cultural da comunidade indígena deveriam ser realizadas por aqueles que a integram. Ressaltou, ainda, que a relação do silvícola com a terra não possui natureza puramente econômica, mas existencial, adotando um caráter de direito identitário, integrante do conceito de dignidade humana.
Na sentença, assinada na última quarta-feira (9/9) pelo juiz-substituto Joel Luís Borsuk, foi esclarecido que a atual ocupação dos índios da etnia guarani, na região de Mato Preto, iniciou no mês de setembro de 2003, a partir de um ‘‘acampamento de retomada’’, localizado numa área pública às margens da rodovia RS-135 e do leito da ferrovia Santa Maria-Marcelino Ramos. ‘‘Controvertem as partes a respeito apenas quanto ao conceito que deve prevalecer acerca do que seja ocupação tradicional indígena. Ou seja, as suas implicações com a ocupação passada da área e/ou a existência de esbulho renitente por parte de não índios – e neste caso o seu conceito, existência no caso concreto e até quando teria perdurado”, pontuou na sentença. Segundo o juiz, pela memória oral dos indígenas coletada no processo administrativo e pela documentação histórica juntada aos autos, é possível determinar que houve a criação formal, por parte do estado do Rio Grande do Sul, de uma área destinada aos guaranis com 223.635 hectares na década de 1920. Esclareceu que a ocupação teria perdurado desde os anos de 1920 até meados da década de 1930, quando os guaranis deixaram a região. Na sua visão, ainda que se admita a possibilidade de esbulho renitente por parte de não-índios até a desocupação completa da área pelos indígenas, fica claro que, na data da promulgação da Constituição, não havia qualquer conflito possessório, esbulho renitente de não-índios ou obstinação dos indígenas na busca da retomada das terras. ‘‘Portanto, no caso concreto, não se verifica ocupação tradicional dos índios guaranis na região de Mato Preto ao tempo da promulgação da Constituição Federal de 1988 (05/10/1988), sempre devendo ser salientado que o STF não compreende a palavra ‘tradicionalmente’ como posse imemorial”.
Vê-se mais um caso de injustiça, portanto esse entendimento precisa ser revisto com urgência, considerando que muito indígenas foram expulsos de suas terras, inclusive para a construção de grandes obras, como foi o caso da hidrelétrica de Itaipu e, portanto, não poderiam estar (porque esbulhados) ocupando as suas terras por ocasião da promulgação da Constituição Federal de 1988.
*** Esse texto foi publicado na coluna semanal do Jornal A Crítica, aos 11/09/2015.
MP 685/2015
Em recente decisão, a Justiça Federal decidiu a impossibilidade de se presumir, de forma automática, que o contribuinte que atrase ou não entregue declaração de planejamento tributário à Receita Federal tenha se omitido dolosamente com o intuito de sonegação ou fraude, como estabelece a Medida Provisória 685/2015. No Mandado de Segurança (MS) nº 0016111-48.2015.403.6100, impetrado por Maquimasa do Brasil Indústria e Comércio, perante a 4ª Vara Cível de São Paulo, foi concedida medida liminar suspendendo a obrigação de informar planejamento tributário ao Fisco prevista na MP 685/2014, sob o fundamento de que a obrigação de informar previamente suas estratégias ao órgão violaria princípios constitucionais da ordem econômica ao não permitir que pessoas e empresas conduzam seus negócios da forma que quiserem. Em função dessa decisão, caso o Fisco venha a suspeitar dessas condutas, deve prová-las antes de aplicar multa de 150% e pedir que o Ministério Público Federal (MPF) investigue prática de crime. Com base nesse entendimento, foi suspensa a obrigação de a empresa entregar a declaração de planejamento fiscal exigida pela MP 685/2015 até 30 de setembro.
No mencionado MS, impetrado contra o delegado da Receita Federal do Brasil de Administração Tributária em São Paulo, a empresa sustentou ser a norma ilegal e inconstitucional em face da presunção de dolo do contribuinte e da violação a princípios da ordem econômica e financeira. Em seu decisum, a Juíza Federal Raquel Fernandez Perrini assentou não poder ser presumido o dolo do contribuinte quando este atrasa ou não entrega a declaração de planejamento tributário, especialmente pelo fato de a MP 685/2015 usar termos vagos para definir as estratégias que devem ser informadas. Segundo a Juíza, “o ordinário se presume, e o extraordinário deve ser provado”. A magistrada também esclareceu que “o planejamento tributário, desde que concebido nos limites da ordem jurídica, é procedimento legítimo, dado que é capaz de gerar legalmente uma redução da carga tributária incidente sobre a atividade empresarial”. Diante disso, ela expressou entendimento no sentido de que a obrigação de o contribuinte consultar o Fisco sobre atos ou negócios jurídicos ainda não executados suprime a livre condução de seus negócios e, por isso, desrespeita as garantias da livre iniciativa, da livre concorrência e da propriedade privada.
A juíza federal destacou, ainda, que a MP 685/2015 não cumpre os requisitos de urgência e relevância, uma vez que o objetivo dela foi regular o parágrafo único do artigo 116 do Código Tributário Nacional (que autoriza a Receita a desconsiderar atos de elisão fiscal), dispositivo legal esse que se encontra em vigor desde 2001. E, em analisando os requisitos da liminar, Raquel Perrini reconheceu a presença da “fumaça do bom direito”. Com relação ao “perigo da demora”, a seu ver, se verifica pela obrigação de a Maquimasa ter que informar seu planejamento tributário ao Fisco até 30 de setembro. Com o atendimento aos dois pressupostos processuais, a juíza deferiu a liminar e suspendeu a exigência imposta pela MP 685/2015.
Essa decisão é considerada um marco na relação de desigualdade e condição de inacessibilidade, tão reclamados pelos contribuintes em relação ao fisco.
*** Esse texto foi publicado na coluna semanal do Jornal A Crítica, aos 04/09/2015.
Eleição nos Tribunais
No último dia 19 de agosto de 2015, a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado Federal deu parecer favorável ao Projeto de Emenda Constitucional (PEC) 15/12, que institui “eleições diretas” para os cargos diretivos dos Tribunais de Justiça (TJs) estaduais, Tribunais Regionais Federais (TRFs) e Tribunais Regionais do Trabalho (TRTs).
Esse tema já havia sido objeto de debate durante a tramitação da Emenda Constitucional (EC) 45/04, que implantou a chamada reforma do Poder Judiciário. Foi por meio dessa reforma que foi criado o Conselho Nacional de Justiça (CNJ), passando a integrar o Poder Judiciário no texto constitucional, logo abaixo do Supremo Tribunal Federal (STF) e acima do Superior Tribunal de Justiça (STJ). A EC 45/04, todavia, teve a cautela e bom senso de afastar as eleições diretas para os cargos diretivos dos tribunais, exatamente, para preservar o princípio constitucional da independência da Magistratura.
Mas, apesar de tão feliz precedente, a CCJ do Senado voltou a apreciar o tema e, mediante parecer, entendeu de submeter novamente a ideia à apreciação daquela Casa Legislativa. Na eventualidade de ser, a PEC 15/12, aprovada pelo plenário do Senado Federal, as políticas interna e externa vão impregnar a carreira da Magistratura, com implicações inimagináveis e devastadoras. A política sempre teve, como raiz, a disputa pelo poder, sendo campo aberto para as desavenças e contrastes.
A possível extensão de eleições diretas para cargos diretivos dos Tribunais de Justiça e Tribunais Regionais Federais, com a participação de todos os magistrados, induvidosamente, irá aumentar a disputa e, por via de consequência, acirrar as divisões entre os membros do Poder Judiciário. Irão se formar diversos grupos de política interna dentro do Poder Judiciário, prejudicando a serenidade que se espera da atividade judicante. Mazelas como candidatos plantados, à espera de um possível lançamento na disputa dos cargos, oferta de favores ou troca de benesses, em negociações de apoio político, poderão ocorrer, assim como a cizânia e com ela a divisão entre os juízes, com o cultivo das desavenças que a ninguém aproveita.
*** Esse texto foi publicado na coluna semanal do Jornal A Crítica, aos 28/08/2015.
Agenda do STF
É possível perceber que no julgamento do Recurso Extraordinário (RE) 635.659, sobre a constitucionalidade da proibição do porte para consumo de drogas, há muito de política, o que não é de todo mal, pelo contrário, questão natural para o funcionamento de instituições democráticas. Esse caso tem assumido destaque e importância na agenda do Supremo Tribunal Federal (STF) por estar ligado a um grave problema de política pública: a superlotação carcerária. Por esse prisma, podemos considerar não ter sido por acaso que este caso foi pautado juntamente com o que tratava da possibilidade do Poder Judiciário obrigar o Executivo a fazer reformas e construções em presídios para garantir a dignidade dos presos.
O STF e o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) tem sido, não é de hoje, as instituições mais engajadas com a questão carcerária e que com ela tem se preocupado e por ela tem se responsabilizado. E é justamente a política de drogas atual que tem sido responsável pelo rápido aumento no encarceramento e a consequente degradação da situação dos detentos nas penitenciárias brasileiras. Segundo dados do Dossiê elaborado pela Plataforma Brasileira de Política de Drogas para o julgamento da descriminalização do porte para consumo próprio, desde quando foi sancionada a nova lei de drogas, em 2006, o número de pessoas presas por tráfico de drogas subiu de 60 mil para 150 mil, passando a representar quase 30% da população carcerária do país. Com relação às mulheres as consequências foram ainda mais perversas, fazendo com que, hoje, 63% das mulheres presas respondam por tráfico de drogas. Importante observar que, enquanto a taxa de encarceramento geral cresceu, no período de 2006 a 2012, cerca de 40%, o número de presos por tráfico de drogas subiu mais de 130%.
Mas por que falar de encarceramento de acusados por tráfico se o julgamento trata de porte para consumo pessoal? Porque ela nos remete a outro importante elemento político no julgamento que o STF vem enfrentando: a definição de critérios objetivos para diferenciar usuários e traficantes. Uma das razões para o aumento de presos por tráfico após a sanção da nova lei de drogas em 2006 foi justamente a falta de critérios objetivos para essa distinção. É cediço que essa situação tem levado muitos usuários de drogas a responderem criminalmente por tráfico. Se o Brasil contasse com critérios objetivos para identificação de usuários de maconha, como os que são utilizados atualmente na Espanha, a título de exemplo, 70% dos presos por tráfico em São Paulo seriam considerados usuários. Assim, caso o STF considere ser inconstitucional a proibição do porte para consumo pessoal, para que essa decisão tenha eficácia será necessária uma definição objetiva do significado de usuário.
O normal seria que a definição desses critérios objetivos fosse realizada pelo Poder Legislativo, ainda que em diálogo com os Poderes Executivo e Judiciário. Todavia, diante da inação dos outros poderes, o STF terá que enfrentar essa questão. Em auxílio técnico, um grupo de especialistas se reuniu para discutir padrões de uso brasileiros de maconha, cocaína e crack de maneira a sanar uma lacuna de informação oficial que existe no debate sobre critérios objetivos. Após a análise redigiram uma Nota Técnica, onde apresentam três cenários possíveis de quantidades que levariam a crer tratar-se de porte para consumo pessoal. Esclareça-se que a indicação de quantidade deve ser entendida como um parâmetro de presunção relativa, que não funciona como indicador da classificação final do caso, mas serve como referência ao juiz que analisa o caso concreto.
*** Esse texto foi publicado na coluna semanal do Jornal A Crítica, aos 21/08/2015.
Consumo Próprio
Entra em pauta no Supremo Tribunal Federal (STF), para julgamento na próxima quarta-feira, o Recurso Extraordinário (RE) 63.659, que questiona acórdão do Colégio Recursal do Juizado Especial Cível de Diadema/SP que, por entender constitucional o artigo 28 da Lei 11.343/2006, manteve a condenação do recorrente pelo crime de porte de drogas para o consumo pessoal. O Tribunal reconheceu a existência de repercussão geral da questão constitucional suscitada, portanto sua decisão de mérito terá efeito direto nos casos similares que, apenas em trâmite no STF, somam 96. Em discussão saber se a constituição autoriza a tipificação penal do uso de drogas para consumo pessoal. Pela legislação questionada, atualmente, adquirir, guardar ou portar drogas para si é considerado crime, podendo ser punido com advertência, prestação de serviços à comunidade ou medida educativa. O usuário acaba respondendo em liberdade, mas uma condenação lhe retira a condição de réu primário.
Sustenta o recorrente, Francisco Benedito de Souza, que “o crime (ou a infração) previsto no artigo 28 da Lei 11.343/2006 ofende o princípio da intimidade e vida privada, direito expressamente previsto no artigo 5º, inciso X, da Constituição Federal e, por conseguinte, o princípio da lesividade, valor basilar do direito penal”. Defende, em síntese, que “à conduta de portar drogas para uso próprio falta a necessária lesividade” e que o comportamento considerado pelo legislador ordinário como criminoso retrata apenas o exercício legítimo da autonomia privada, resguardada constitucionalmente pelo direito à vida íntima. No seu entender, “O porte de drogas para uso próprio não afronta a chamada ‘saúde pública’ (objeto jurídico do delito de tráfico de drogas), mas apenas, e quando muito, a saúde pessoal do próprio usuário”.
O parecer do Procurador Geral da República foi na mesma linha do defendido pelo Ministério Público do Estado de São Paulo (MPSP), ou seja, pelo desprovimento do recurso extraordinário e manutenção da criminalização. Todavia, três, dos onze Ministros do STF, sob a condição de não terem seus nomes divulgados, afirmaram a veículos de comunicação de circulação nacional que a tendência do STF é pela descriminalização do porte de entorpecentes para uso pessoal. A proposta do relator, ministro Gilmar Mendes, é que o infrator seja levado à presença de um Juiz para que ele analise, antes de qualquer processo, se ele deve ser enquadrado como usuário ou traficante. A ideia teria aval do ministro Marco Aurélio que se mostrou contra ser o STF que fixasse critério para definir se o infrator é usuário ou traficante pois, para ele, a Corte Suprema não poderia simplesmente dizer que quem porta pequena quantidade seja apenas usuário, já que poderia ser apenas a quantidade de entrega ao consumidor. Para o ministro Barroso a quantidade por si só não deve ser critério de distinção entre usuário e traficante, devendo ser levada em conta singularidades de cada caso. Eventual efeito retroativo poderá, também, ser discutido pelos ministros.
O caso tem como “Amici Curiae”: A Instituição Viva Rio, a Comissão Brasileira Sobre Drogas e Democracia (CBDD), Associação Brasileira de Estudos Sociais do Uso de Psicoativos (ABESUP), o Instituto Brasileiro de Ciências Criminais (IBCCRIM), o Instituto de Defesa do Direito de Defesa (IDDD), a Conectas Direitos Humanos, o Instituto Sou da Paz, o Instituto Terra, Trabalho e Cidadania (ITTC) e a Pastoral Carcerária foram admitidas no processo na condição de “amici curiae”.
*** Esse texto foi publicado na coluna semanal do Jornal A Crítica, aos 14/08/2015.
Depósitos Judiciais
Com a cassação, pelo Supremo Tribunal Federal (STF), do regime especial de pagamento de precatórios, que dava ao Executivo até 15 anos para honrar suas dívidas, os Estados buscavam uma alternativa. A Constituição Federal estabelece que o ente público responsável pelo precatório tem um ano para pagá-lo, a partir de seu reconhecimento. Por essa razão, atendendo demanda de Governadores, para aumentar o caixa dos Executivos Estaduais e pagar seus precatórios, a Presidente Dilma Rousseff sancionou, nesta última quinta-feira (6/8), a lei que determina a transformação do dinheiro dos depósitos judiciais em receita do Executivo. A lei foi usada como instrumento de negociação entre os governos federal e estaduais.
Publicada com alguns vetos, a Lei Complementar nº 151/2015 mantém a transferência de 70% do dinheiro dos depósitos judiciais e administrativos para os cofres da União, dos estados e dos municípios. Os outros 30% serão destinados a um fundo de provisionamento, justamente para custear litígios judiciais.
A lei, de inciativa do senador José Serra (PSDB-SP), tem como principal interessado o governo de São Paulo, responsável pela maior parte da dívida entre público e particular. Segundo dados do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), o Brasil tinha, até o primeiro semestre de 2012, R$ 96 bilhões em precatórios, e só o estado de São Paulo correspondia a R$ 24,4 bilhões — estado e municípios, juntos, chegavam a R$ 51,1 bilhões.
Todavia, para a Procuradoria-Geral da República (PGR), transferência de depósito judicial é inconstitucional. Ao se posicionar em processos no STF que discutem a questão, a PGR defende que esse tipo de medida ofende o direito à propriedade dos titulares dos depósitos e estabelece um "empréstimo compulsório", o que é vedado pelo artigo 148 da Constituição Federal.
A lei também modifica a regra de administração dos depósitos. Hoje, apenas os bancos públicos federais, o que se resume à Caixa Econômica Federal e o Banco do Brasil, podem administrá-lo. De acordo com os balanços dos bancos, no primeiro trimestre deste ano, o Brasil tem R$ 174 bilhões em depósitos judiciais: R$ 118,6 bilhões no BB e R$ 55,2 bilhões na Caixa. Mas, pelo texto da nova lei complementar, essa responsabilidade agora ficará dividia entre bancos oficiais federais, estaduais e municipais.
De acordo com o autor da proposta, José Serra, a lei resultará numa receita de R$ 21 bilhões aos cofres estaduais e municipais já neste ano de 2015 e de R$ 1,6 bilhão anuais. É um negócio que vale a pena para os Estados, pois, em 2014, segundo dados divulgados, enquanto os depósitos totais no Banco do Brasil caíram 4,6% em relação a 2013, os depósitos judiciais subiram 13% e ficaram em R$ 115 bilhões, o que também permite concluir que entre dezembro de 2014 e março de 2015 o volume de depósitos saiu de R$ 115 bilhões para R$ 118 bilhões. Na Caixa o crescimento foi próximo dos 20% nesse mesmo período.
Mas essa medida pode comprometer seriamente o caixa de alguns Tribunais estaduais. A maioria dos grandes Tribunais de Justiça usa um mecanismo de remuneração que se baseia nos depósitos judiciais (Taxa de Administração dos Depósitos Recursais). Noutras palavras, o banco que administra os depósitos judiciais paga uma taxa ao tribunal correspondente em troca de ter o dinheiro em seus cofres. Em São Paulo, cujo TJ é o maior do país, em agosto de 2012, os depósitos recursais chegavam a R$ 36 bilhões, o que rendia uma remuneração mensal de R$ 840 milhões ao TJSP (taxa de 0,235% ).
*** Esse texto foi publicado na coluna semanal do Jornal A Crítica, aos 07/08/2015.
Estatuto da Pessoa com Deficiência
A edição do Estatuto da Pessoa com Deficiência (Lei 13.146/2015) trouxe alterações ao Código Civil, repercutindo no Direito de Família, além de confrontações com o novo CPC. Sua vigência se dará em 180 dias da sua publicação (07/07), portanto no final do mês de dezembro de 2015. A lei trás notável avanço com relação à proteção da dignidade da pessoa com deficiência, sobretudo em relação à antiga Teoria das Incapacidades, o que repercute diretamente em institutos como o casamento, a interdição e a curatela.
Uma crítica que se faz à nova lei, todavia, é que ela alterou alguns artigos do Código Civil que foram revogados expressamente pelo Novo CPC (art. 1.072). Assim, salvo nova iniciativa legislativa, as alterações terão aplicação por curto intervalo de tempo, até março do próximo ano.
Por outro lado, ao revogar todos os incisos do art. 3º do Código Civil, aboliu do sistema privado brasileiro, a pessoa absolutamente incapaz que seja maior de idade. Como consequência, não há que se falar mais em ação de interdição absoluta no nosso sistema civil, já que menores não são interditados. Todas as pessoas com deficiência, das quais tratava a norma revogada, passam a ser, em regra, plenamente capazes para o Direito Civil, o que visa a sua plena inclusão social, em prol de sua dignidade.
Merece destaque o art. 6º da Lei 13.146/2015, segundo o qual a deficiência não afeta a plena capacidade civil da pessoa. Em suma, no plano familiar há uma expressa inclusão plena das pessoas com deficiência. Eventualmente, e em casos excepcionais, tais pessoas podem ser tidas como relativamente incapazes em algum enquadramento do novo art. 4º do Código Civil. A título de exemplo, aponta-se a situação de um deficiente que seja viciado em tóxicos, podendo ser tido como incapaz como qualquer outro sujeito.
O novo diploma legal, por sua vez, não faz mais referência às pessoas com discernimento reduzido, que não são mais consideradas relativamente incapazes, como antes estava regulamentado. Apenas foram mantidas no diploma as menções aos ébrios habituais (entendidos como os alcoólatras) e aos viciados em tóxicos, que continuam dependendo de um processo de interdição relativa, com sentença judicial, para que sua capacidade seja reconhecida.
Da mesma forma, foi alterado o inciso III do art. 4º do CC/2002, sem mencionar mais os excepcionais sem desenvolvimento completo. O portador de síndrome de Down, não é mais considerado um incapaz. A nova redação dessa norma passa a enunciar as pessoas que, por causa transitória ou permanente, não puderem exprimir vontade, o que antes estava previsto no inciso III do art. 3º como situação típica de incapacidade absoluta. Agora a hipótese é de incapacidade relativa.
*** Esse texto foi publicado na coluna semanal do Jornal A Crítica, aos 31/07/2015.
Aplicativo Uber
Para quem não conhece, o aplicativo Uber conecta motoristas autônomos a pessoas em busca de transporte. Essa ferramenta, todavia, vem sendo combatida pelas entidades representativas de taxistas, que buscam na Justiça impedir seu funcionamento. Por oferecer uma frota composta por carros de luxo, facilitar o pagamento diretamente no cartão de crédito e inclusive apresentar a rota e o valor estimado para o trajeto quando da solicitação do serviço, o aplicativo caiu no gosto de usuários e despertou a ira de taxistas, que acusam a empresa de concorrência desleal.
Esta semana, porém, o aplicativo recebeu parecer favorável de renomado constitucionalista brasileiro, professor da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), com fundamentos suficientes para comprovar que os protestos não atenderiam ao interesse público, mas visariam garantir “reserva de mercado”. A tese construída pelo professor Daniel Sarmento defende a legalidade do serviço e aponta que a atividade do Uber se enquadra no setor de transporte privado de passageiros, que não é privativa dos motoristas de táxi. Segundo o parecer, o transporte privado de passageiros tem previsão na Lei 12.587/2012, que estabeleceu a política nacional de mobilidade urbana. Embora esteja sujeito ao controle estatal, são as regras de livre concorrência que valeriam para esse tipo de atividade. “Portanto, a criação de embaraços estatais à competição, com a instituição de reservas e privilégios a empresas ou grupos específicos, viola não apenas os direitos dos potenciais concorrentes prejudicados. Mais que isso, ela ofende os interesses dos consumidores e da própria sociedade”, explicou o professor. No documento, Sarmento destacou que o Legislativo de alguns municípios onde o Uber atua têm estudado leis para a atividade. Contudo, ele entende que vereadores não teriam essa competência. “Apenas a União Federal pode disciplinar a atividade de transporte individual de passageiros, em razão da sua competência privativa para legislar sobre transportes”, disse Sarmento.
No Judiciário, o aplicativo responde a processos nas cidades onde atua. Em abril deste ano, o Tribunal de Justiça de São Paulo suspendeu a atividade da empresa, por considerá-la clandestina. O descumprimento estava sujeito a multa diária de R$ 100 mil. No mês seguinte, a Corte votou atrás e hoje o serviço funciona normalmente.
*** Esse texto foi publicado na coluna semanal do Jornal A Crítica, aos 17/07/2015.
Maioridade Penal
Texto assinado por 24 dos 27 Secretários de Justiça do país, que será entregue aos parlamentares das duas Casas do Congresso Nacional, demonstra preocupação com a nova emenda que reduz de 18 para 16 anos a maioridade penal, aprovada há uma semana (02/07), em primeiro turno, na Câmara dos Deputados. O manifesto pede a realização de estudos de impactos econômicos e sociais da aplicação da proposta que reduz a idade mínima para que uma pessoa possa ser julgada criminalmente por seus atos como um adulto, antes da votação em segundo turno. Não teriam assinado o documento os secretários de Justiça de São Paulo, Sergipe e Goiás.
Justificou o diretor do Departamento Penitenciário Nacional (Depen), Renato Devitto, um dos coordenadores do manifesto, que “a discussão da emenda no Congresso seria muito enriquecida se os parlamentares pudessem conhecer esses impactos e debatê-los com a sociedade brasileira”.
Para relembrar, a nova emenda à Constituição aprovada pela Câmara mantém a redução para os crimes de estupro, sequestro, latrocínio, homicídio qualificado e outros (crimes hediondos), homicídio doloso e lesão corporal seguida de morte. Também mantém a regra de cumprimento da pena em estabelecimento separado dos destinados aos maiores de 18 anos, a dos menores inimputáveis e propõe a criação de estabelecimentos específicos para que os adolescentes cumpram a pena.
Segundo o diretor do Depen, o sistema prisional já tem déficit de 231 mil vagas e, se a proposta for aplicada, “dezenas de milhares de adolescentes” vão entrar nele. Hoje são 607 mil presos para 376 mil vagas. Uma redução da maioridade penal, segundo ele, aumentaria em cerca de 40 mil o número de pessoas: “para nós, é muito claro, e praticamente uma unanimidade entre os secretários de Justiça, que não resolveremos a violência urbana apostando no aumento da população prisional. O contingente de adolescentes que requerem um procedimento especial é mais um problema com que nós, gestores, teremos que lidar”, disse Devitto.
Além do diretor do Depenm participaram de entrevista coletiva que divulgou o manifesto, os secretários de Justiça do Piauí, do Espírito Santo e de Mato Grosso. Para o secretário de Justiça do Piauí, Daniel Oliveira, a inserção da matéria em pauta, um dia após ter sido rejeitada no plenário da Câmara, foi uma manobra inconstitucional. “Acredito também que a manobra legislativa que foi implementada ontem na Câmara dos Deputados padece de vício de inconstitucionalidade. Falo isso como advogado e como operador do direito”. O secretário de Justiça do Piauí afirmou ainda que a própria redução da maioridade penal fere uma cláusula pétrea da Constituição. “A Constituição disciplina um conjunto de diretrizes, e uma delas é a cláusula pétrea que proíbe o retrocesso em matérias de direitos e garantias fundamentais. E essa, sem dúvida alguma, é uma ofensa a todo o ordenamento jurídico de garantias e direitos fundamentais previstos.”
O discurso dos secretários e do diretor da Depen coincidem com declarações do ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, que manifestou preocupação com a medida, sinalizando possível veto da Presidente Dilma Rousseff, caso venha a ser aprovada. Algumas horas antes da aprovação da emenda aglutinativa, Cardozo disse que não há espaço nas prisões para separar os adolescentes do resto da população carcerária, como reza o texto dos deputados. “Até que se criem as vagas para os adolescentes de 16 e 17 anos, eles serão trancados nos presídios atuais e as organizações criminosas vão cooptar esses jovens. E, quando o Brasil acordar disso, já teremos perdido muitas vidas.”
*** Esse texto foi publicado na coluna semanal do Jornal A Crítica, aos 10/07/2015.
Pensão por Morte
A pedidos, vou abordar hoje o tema do benefício previdenciário da Pensão por Morte, comentando a aprovação, no dia 27/05, da Medida Provisória n. 664/14, que muda as regras para concessão de pensão por morte e auxílio-doença no Senado Federal. O Senado não promoveu qualquer alteração em relação ao texto aprovado na semana anterior na Câmara dos Deputados, onde ocorreram modificações no texto original, benéficas aos segurados. Mesmo assim, dentre as regras aprovadas, estão algumas restrições no que diz respeito ao acesso ao benefício da Pensão por Morte.
Pelo texto aprovado, os cônjuges só poderão requerer pensão por morte do companheiro se o tempo de união estável ou casamento for de mais de dois anos e o segurado tiver contribuído para o INSS por, no mínimo, um ano e meio. Antes, não era exigido tempo mínimo de contribuição para que os dependentes tivessem direito ao benefício, mas era necessário que, na data da morte, o segurado estivesse contribuindo para a Previdência Social.
O texto original enviado pelo governo previa, para a concessão do benefício, dois anos de união e dois anos de contribuição. O Senado também confirmou a alteração feita na Câmara que institui que o benefício pago pela Previdência Social aos pensionistas continuará sendo o valor da aposentadoria que o segurado recebia ou teria direito a receber se estivesse aposentado por invalidez na data da morte. O governo havia previsto no texto original a redução do benefício pela metade. Além disso, quando o tempo de casamento ou de contribuição forem inferiores ao necessário para se ter o benefício, o cônjuge terá ainda assim direito a uma pensão, mas somente durante quatro meses. O texto original não previa a concessão desse benefício temporário.
De acordo com a MP, a tabela de duração das pensões aos cônjuges, fixando como base a idade, e não a expectativa de vida dos pensionistas, fica da seguinte forma: (1) 3 anos de pensão para cônjuges com menos de 21 anos de idade; (2) 6 anos de pensão para cônjuge com idade entre 21 e 26 anos; (3) 10 anos de pensão para cônjuge com idade e entre 27 e 29 anos; (4) 15 anos de pensão para cônjuge com idade entre 30 e 40 anos; (5) 20 anos de pensão para cônjuge entre 41 e 43 anos; e, (6) Pensão vitalícia para cônjuge com mais de 44 anos.
*** Esse texto foi publicado na coluna semanal do Jornal A Crítica, aos 26/06/2015.
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