segunda-feira, 17 de fevereiro de 2014

Biografia Não Autorizada

A discussão sobre a colisão do princípio da liberdade de expressão com o princípio do direito à vida privada que, no âmbito do Supremo Tribunal Federal tem sido dada, ora prevalência a um, ora preponderância a outro, dependendo do caso concreto, voltou à tona com a questão das biografias não autorizadas. Em audiência pública realizada ontem no STF, foram lembrados casos em que o princípio da liberdade de expressão prevaleceu - Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADi) nº 4451, denominada ADi do Humor nas Eleições - quando julgada o STF suspendeu dispositivos da Lei Eleitoral que proibiam a veiculação de charges e humor com candidatos em emissoras de rádio e de televisão e, outro, que o princípio da vida privada foi preponderante – Habeas Corpus (HC) nº 82424, no qual Siegfried Ellwanger buscou reverter uma condenação pelo crime de racismo, por disseminar, em livros escritos, editados e vendidos, ideias antissemitas contra judeus. Nesse último caso, o STF, por maioria, manteve a condenação. Para a professora Silmara Chinelato, representante da Comissão de Direitos Autorais da OAB, o Código Civil de 2002 é uma conquista em defesa da pessoa. Por outro lado, a professora destacou não haver causa e efeito entre a liberdade de expressão e direito à vida privada, devendo ser distinguido, também, o que é interesse público e o que é “curiosidade do público”. Chinelato defendeu, ainda, não ser a liberdade de expressão absoluta, tampouco ser as liberdades públicas incondicionais, de forma que exteriorizadas, sempre haverá responsabilidade, com ou sem consentimento do biografado, ressaltando, nesse ponto, não ser o biografado detentor do direito autoral. Assim, no dizer da representante da OAB, a interpretação dos artigos 20 e 21 do Código Civil, à luz da Constituição Federal, não pode ser outra senão a de que eles dispensam a autorização, mas não afastam a responsabilidade civil se houver dano patrimonial ou moral. Esse posicionamento, que também defendo nas minhas aulas de Direito Constitucional, sustenta, dentre outros pontos, não haver hierarquia entre os princípios da liberdade de expressão e o da privacidade. A representante do Instituto Palavra Aberta, Patrícia Blanco, defendeu a liberdade de expressão sem censura de qualquer natureza. O seu pronunciamento se deu em torno da defesa da plena liberdade de ideias, pensamento e expressão. Para Patrícia Blanco a manifestação de pensamento deve ser divulgada, independentemente de censura ou autorização. Ela sustentou ser a biografia um gênero literário autônomo e que a necessidade de autorização prévia cria condição absurda de um escritor ter que pedir autorização às famílias de vítimas de uma guerra, por exemplo, para escrever sobre a mesma, dando como exemplo a II Guerra Mundial e o Holocausto. Para a representante do Instituto, uma biografia implica responsabilidade com a história e com a verdade e, se por acaso existirem equívocos, difamação ou inverdades, o autor responderá posteriormente. A Ministra Carmem Lúcia, relatora da Adi, prometeu liberar a ação até início de dezembro para julgamento. * Esse texto foi publicado na coluna semanal do jornal A Crítica aos 22/11/2013.

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