A maioria dos relacionamentos inicia-se com a conquista, fase de esperanças, receios e disfarces. Em seguida surge a confiança a ponto de ficar desarmado na presença do outro, um período de compartilhamento de planos/sonhos e de experiências passadas, visando à cura de feridas relacionadas ao amor. Finalmente vem a fase de desemaranhar e assimilar os aspectos da vida-morte-vida do relacionamento, durante a qual a maioria desiste nas primeiras crises. Muitos relacionamentos balançam quando passa a fase do morcego (cegueira), percepção, às vezes demorada, do que, de fato, foi conquistado. Esse fenômeno se aplica a outro tipos de relacionamento (mãe/bebê; pai/filho adolescente; amizades).
Mas quando passa a fase de paixão, toda a “boa vontade” oscila e se abala. A fase teatral na qual se encenam as ilusões e fantasias, é substituída por um relacionamento verdadeiro e desafiador, quando toda a experiência e habilidade são necessárias. Todavia, se os amantes insistirem numa vida de êxtase artificial, de um constante desenrolar de prazeres e de outras formas de sensações intensas e entorpecedoras; se ansiarem eterna tempestade sexual com trovões e relâmpagos, sem nenhum tipo de compartilhamento de conflitos, bloqueiam o ciclo da vida-morte-vida. Quando os parceiros, ou um deles, não compreendem a necessidade de esgotamento dos ciclos de transformação: quando algo precisa morrer e ser substituído, se não puderem suportar esse processo, o relacionamento não fluirá além das aspirações hormonais. O anseio de forçar o amor a seguir somente no seu lado mais positivo é o que faz com ele acabe morrendo, e para sempre. Sem esse conhecimento não pode haver fidelidade, não pode haver uma devoção ou um amor verdadeiro. O amor tem seu custo e exige enfrentamento desse ciclo.
Quando os parceiros têm capacidade de assimilar os ciclos do amor ( vida-morte-vida) como uma continuidade – como uma noite entre os dias – e como aquela força geradora de um amor que resiste por toda a vida, juntos os dois se fortalecem, passando a compreender os dois mundos em que vivem, o real e o espiritual.
Coluna do Jornal A Crítica de 14/06/2008
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